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Reforma Política

Redução no número de partidos é resposta do sistema político e auxilia na governabilidade, diz especialista

Legendas com participação na Câmara atingiram menor Ă­ndice desde 2002; com desfiliações e ampliação da clĂĄusula de barreira, tendĂȘncia Ă© de queda na quantidade de legendas


Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Passadas as eleições gerais de 2022, a polĂ­tica brasileira assistiu a um processo de redução do nĂșmero de partidos no Congresso Nacional. A diminuição da representatividade brasileira das duas Ășltimas legislaturas é algo recente, jĂĄ que nas Ășltimas eleições, o nĂșmero de legendas que passaram a ocupar os espaços legislativos aumentaram. Segundo nĂșmeros divulgados pela Câmara dos Deputados através de seu site oficial, em 1994 e 1998, o nĂșmero de legendas com representação na Casa Legislativa era de 15 partidos. Em 2002, aumentou para 16. Em 2006, 21. Em 2010, 19. Em 2014, 28. E atingiu seu ĂĄpice em 2018, quando 30 partidos polĂ­ticos dividiam o espaço ocupado por 513 deputados. Com a fragmentação partidĂĄria e um nĂșmero recorde de partidos com mandatos em BrasĂ­lia, foi aprovado em 2017 uma reforma polĂ­tica que decretou o fim das coligações e a criação da clĂĄusula de barreira – medida que impõe a conquista de ao menos 1,5% dos votos vĂĄlidos nacionais na disputa a deputado federal, distribuĂ­dos em pelo menos um terço dos Estados. Caso o partido não consiga atingir as imposições, a legenda serĂĄ impedida de ter acesso aos recurso dos fundos Eleitoral e PartidĂĄrio, além de não ter seu tempo de televisão nas próximas disputas eleitorais.

Para entender essa tendĂȘncia de diminuição no nĂșmero de siglas, a equipe de reportagem conversou com um especialista para entender se os resultados das mudanças impostas pela reforma polĂ­tica melhoraram ou pioraram a a gestão pĂșblica.

Reforma polĂ­tica

Aprovada em 2017 pelo Senado Federal e sancionada pelo então presidente Michel Temer (MDB), o projeto de lei 110/2017 passou a impor certas condições para que partidos polĂ­ticos pudessem ter acesso aos fundos Eleitoral e PartidĂĄrio. Anteriormente, todas as legendas recebiam uma fatia do fundo partidĂĄrio (recurso utilizado para manter a estrutura das legendas), e o tempo de propaganda veiculada nas rĂĄdios e na televisão era calculado de maneira proporcional à bancada na Câmara. Após a aprovação do texto, a clĂĄusula de barreira impôs aos partidos que estes tenham, no mĂ­nimo, 1,5% do total de votos vĂĄlidos distribuĂ­dos em 9 estados ou mais, além de ter, no mĂ­nimo, 1% dos votos nos respectivos Estados, ou que as legendas elejam 9 deputados federais em, no mĂ­nimo, 9 Estados brasileiros. As exigĂȘncias, no entanto, aumentarão gradativamente até 2030. Para Arthur Fisch, cientista polĂ­tico e doutor em administração pĂșblica pela Fundação GetĂșlio Vargas (FGV), a mudança é bem vista porque combate o "excesso de partidos" na polĂ­tica nacional.

Em 2015, o paĂ­s atingiu um nĂșmero recorde de 35 partidos polĂ­ticos registrados. "VocĂȘ ainda pode criar um partido, isso não é um problema. HĂĄ todos os trâmites, mas para ter acesso aos recursos financeiros é preciso uma votação expressiva. É uma resposta do sistema polĂ­tico para a hiperpartidarização que observamos a partir de 2010, que se acentuou e fragmentou o sistema. E isso ainda não acabou, isso vai ficar com um nĂșmero ainda menor de partidos, o que deve colaborar com a governabilidade", disse em entrevista. Desde a aprovação da reforma polĂ­tica em 2015, que forçou fusões e incorporações das legendas, houve uma redução para 31 partidos registrados. HĂĄ, ainda, a anĂĄlise pendente de mais dois pedidos de fusões sob anĂĄlise da Justiça Eleitoral que deve reduzir o nĂșmero de legenda para 29.

Com a tendĂȘncia de diminuição, apenas um partido surgiu diante das nova regras, o nanico Unidade Popular (UP), em 2019. A legenda, vale dizer, lançou Leonardo Péricles como candidato à PresidĂȘncia da RepĂșblica no pleito de 2022, vencido por Lula (PT). Péricles recebeu 0,05% dos votos vĂĄlidos (53.519). De modo a inibir o aparecimento de novos partidos, a reforma polĂ­tica também alterou algumas das regras para o surgimento de novas legendas. Antes, eram necessĂĄrias 500 mil assinaturas de eleitores que poderiam estar filiados em outros partido polĂ­ticos sem um prazo fixo para a coleta dos nomes. Agora, para a criação formal de um partido, também são necessĂĄrias 500 mil assinaturas, porém, em um prazo mĂĄximo de até dois anos sem que nenhum dos signatĂĄrios jĂĄ esteja filiado em outra legenda. Isso foi o que dificultou o surgimento do Aliança Brasil, sigla que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados tentaram criar entre 2019 e 2022. Na ocasião, o então presidente estava sem partido em razão de um racha que implodiu o PSL, de Luciano Bivar, e lançou o plano de criar uma legenda para chamar de sua. Em abril de 2022, o prazo para que o Aliança pudesse ser formado se esgotou com apenas 183 mil assinaturas, ou seja, nem 40% das quase 500 mil exigidas. Caso queira recomeçar a empreitada, as assinaturas teriam de ser coletadas do zero novamente.

A atual legislação, no entanto, não é vista como ruim por Arthur Fisch. "Assim vocĂȘ impede a indĂșstria de criação de partidos. As regras atuais não são excessivamente burocrĂĄticas e a prova disso é a criação de diversos partidos nos Ășltimos anos. Tivemos a criação do PSD, do Novo, do UP. Volta e meia se cria um partido novo. A questão é: vocĂȘ precisa se organizar. HĂĄ um trabalho burocrĂĄtico que precisa ser feito, vocĂȘ precisa ter um esforço de agregar e mobilizar filiados, criar diretórios. Não é para ser um trabalho trivial. O caso mais emblemĂĄtico de fracasso é o caso do Aliança Brasil, mas atribuo isso muito mais à incompetĂȘncia das lideranças que à burocracia. Tivemos tantos casos de sucesso e apenas um de fracasso. É muito mais indicativo de que as pessoas não se organizaram e não conseguiram levar o projeto à frente", explica.

Impactos e diminuição partidĂĄria

Outra importante regra aprovada pela reforma polĂ­tica foi o fim da possibilidade de coligação entre os partidos polĂ­ticos para as eleições de deputados e vereadores, as chamadas disputas proporcionais. Com a medida, torna-se mais difĂ­cil para partidos pequenos elegerem deputados, jĂĄ que eles precisariam fazer, sozinhos, um determinado quociente eleitoral. Em 2018, quando o piso de votos vĂĄlidos foi de 1,5% distribuĂ­dos em nove Estados. À época, 14 partidos não atingiram a clĂĄusula. Na eleição seguinte, em 2022, quando o piso aumentou para 2%, foram 15 legendas que não atingiram os nĂșmeros mĂ­nimos. Em relação ao nĂșmero de partidos efetivos, ou seja, aqueles que tĂȘm participação na Câmara, houve uma queda brusca no Ășltimo ano, passando de 16,46 em 2018 para 9,27 em 2022. Trata-se do menor nĂșmero de efetivo de partidos na Câmara desde 2002. "O nĂșmero tende a diminuir, jĂĄ que hĂĄ deputados que estão trocando de partidos agora que estão começando a legislatura. É o caso, por exemplo, do deputado Bebeto, que saiu do PTB e foi para o PP. Ou seja, o PTB não tem mais deputados na Câmara. JĂĄ é um enxugamento dos partidos, é um movimento natural de deputados que migram de partidos para siglas maiores, onde eles terão recursos ou exposição", afirma o especialista.

"Fui pego de surpresa, assim que ganhei a eleição. Um partido grande e que jĂĄ teve representatividade na Casa e eu fui o Ășnico eleito. Ficou ruim, eu vou migrar para outro partido, porque o PTB não passou na clĂĄusula de barreira", disse o parlamentar de primeiro mandato à TV Câmara no dia de sua posse. O PTB foi comandado até novembro de 2021 por Roberto Jefferson, preso por violar medidas da prisão domiciliar e também pela tentativa de homicĂ­dio de agentes da PolĂ­cia Federal – o ex-deputado federal jogou trĂȘs granadas e deu tiros de fuzil em policiais que foram cumprir o mandado de prisão em sua casa, na cidade de Comendador Levy Gasparian, no interior do Estado do Rio de Janeiro, no dia 23 de outubro de 2022. Assim como o PTB, outros onze partidos não conseguiram romper a clĂĄusula de barreira. Siglas como Agir, DC, PCB, PCO, PMB, PMN, PRTB, PSTU e UP jĂĄ encontravam-se barradas pela legislação desde outras legislatura e, a eles, unem-se: Novo, PTB, Pros, PSC, Patriota e Solidariedade após o pleito de 2022. Com o impedimento, a solução vislumbrada pelos partidos chamados de nanicos foi a fusão, processo no qual mĂșltiplas siglas viram um Ășnico partido, como ocorreu com o PSL e o DEM, que viraram o União Brasil, ou a federalização, quando dois ou mais partidos se unem e apenas atuam como um Ășnico partido, caso da federação "Brasil da Esperança", formada pela atuação em conjunto do Partido dos Trabalhadores (PT), do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e do Partido Verde (PV).

Reflexos no governo

De acordo com Arthur Fisch, a diminuição no nĂșmero de partidos no Congresso pode facilitar a governabilidade e, portanto, torna-se positiva para a polĂ­tica brasileira. Isso porque o custo de negociação do Executivo para ter uma base também diminui ao passo que existem menos lĂ­deres de governo no Congresso Nacional. "A vantagem da redução do numero de partidos também é a diminuição no custo das coalizões. Quando vocĂȘ tem 17 partidos participando no Congresso, vocĂȘ vai negociar muito mais, com 17 lĂ­deres partidĂĄrios para avançar uma votação. Isso acaba sendo um problema para o paĂ­s porque eleva o custo de governabilidade. Com oito ou cinco partidos, vocĂȘ negocia com menos lĂ­deres e tem menos custos para compor e criar alianças. Isso ajuda na governabilidade brasileira", explicou. Questionado se a polarização pode acelerar esse processo de diminuição no nĂșmero de partidos, o pesquisador da FGV descartou essa possibilidade.

"Em uma eleição majoritĂĄria, temos dois principais candidatos em uma eleição de dois turnos. Isso não necessariamente quer dizer [que haverĂĄ] polarização do Parlamento. Não tem, necessariamente, reflexo no nĂșmero de partidos. Tomamos a polarização como uma narrativa fĂĄcil para explicar muito sobre o sistema polĂ­tico, e ela não é. Obviamente, os partidos com as dificuldades, vão se aglutinar em grandes linhas ideológicas. Isso é natural, é comum. Mas isso não quer dizer que haverĂĄ uma divisão em dois grandes blocos. Muito provavelmente haverĂĄ uma consolidação de um nĂșmero menor de partidos que negociarão participações em coalizões", disse. Por fim, o especialista disse que a redução no nĂșmero de legendas pode auxiliar na coletivização dos próprios partidos. "Às vezes pode haver um efeito benéfico porque a aglutinação de deputados em partidos pode forçar uma maior democratização em legendas grandes. Vão ter que, internamente, solucionar seus conflitos. É um possĂ­vel efeito dessas mudanças", pontuou.

Jovem Pan

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