Sigla que rivalizou com o Partido dos Trabalhadores (PT) nas últimas eleições presidenciais, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) vive um período único em sua história. Pela primeira vez desde a redemocratização, o pleito que irá definir o próximo presidente da República não terá um representante tucano. No governo do Estado de São Paulo, palco onde a legenda acumula sete vitórias consecutivas e 28 anos no comando do Palácio dos Bandeirantes, seu candidato, o governador Rodrigo Garcia, encontra-se tecnicamente empatado na segunda colocação nas pesquisas de intenção de voto. No Senado Federal, o PSDB atualmente compõe a quarta menor bancada partidária e sofrerá duas baixas: José Serra (SP) e Tasso Jereissati (CE) encerram seus mandatos e deixam a Casa Legislativa no fim deste ano. Mais do que isso, até a publicação da reportagem, a sigla tinha apenas dois pré-candidatos à Casa Alta do Congresso Nacional: o ex-senador Arthur Virgílio Neto (AM) e o ex-deputado estadual Manoel Pioneiro (PA). A Jovem Pan comparou dados históricos e conversou com especialistas para entender o atual momento da legenda e possíveis causas para sua dificuldade eleitoral.
Com o fim da ditadura militar, os brasileiros voltaram a ter o poder de eleger um presidente que representasse o país. Desde 1989, o PSDB lança candidatos tucanos em todas as eleições e, historicamente, passou a acumular uma crescente no número de eleitores e no percentual dos votos válidos de maneira gradativa. O ápice do partido – em número de votos validos – ocorreu em 2014, quando o atual deputado federal Aécio Neves postulou uma corrida ao Planalto e ultrapassou os 50 milhões de votos no segundo turno da eleição contra Dilma Rousseff (PT). Na ocasião, o tucano foi derrotado pela petista. Na eleição seguinte, em 2018, o resultado pífio que resultou na queda: o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, hoje no PSB e indicado para a vice na chapa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), obteve pouco mais de 5 milhões de votos. Em 2022, a sigla não terá candidato.
Confira, em números, a ascensão e a queda tucana no pleito presidencial ano após ano:
– 1989: 7.790.392 dos votos válidos (11,51%)
– 1994: 34.314.961 votos (54,24%)
– 1998: 35.936.540 votos (53,06%)
– 2002: 19.705.445 votos (23,19%)
– 2002 (Segundo turno): 33.370.739 votos (38,72%)
– 2006: 39.968.369 votos (41,64%)
– 2006 (Segundo turno): 37.543.178 (39,17%)
– 2010: 33.132.283 votos votos (32,61%)
– 2010 (Segundo turno): 43.711.388 votos (43,95%)
– 2014: 34.897.211 votos
– 2014 (Segundo turno): 51.041.155 votos (48,36%)
– 2018: 5.096.349 votos (4,76%)
– 2022: Sem candidato
Com sete vitórias consecutivas, o PSDB governa o Estado mais rico da federação por 28 anos – um dos fundadores da sigla, Geraldo Alckmin é o político que mais tempo esteve à frente do Palácio dos Bandeirantes desde a redemocratização, por pouco mais de 12 anos. A última eleição, porém, mostra um fenômeno semelhante ao da Presidência da República: uma ascensão gradativa até o ano de 2014, onde os tucanos alcançam seu melhor resultado eleitoral, para uma queda brusca no pleito seguinte. O êxito de João Doria em 2018 foi a vitória tucana com a menor margem de diferença para o segundo colocado na história das eleições paulistas (741.610 votos). A título de comparação, em 2014, Alckmin venceu Paulo Skaf (MDB) por uma diferença de mais de 7,6 milhões de votos. Confira abaixo a diferença de votos entre os tucanos vencedores nas eleições com os segundos mais votados:
E a dificuldade segue, já que Rodrigo Garcia, recém-chegado ao ninho tucano (ele foi filiado ao DEM por mais de 25 anos) e candidato do PSDB ao Palácio dos Bandeirantes, está numericamente empatado na segunda colocação com o ex-ministro da Infraestrutura Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos) na corrida pelo governo paulista, de acordo com a mais recente pesquisa Datafolha – o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) tem 34% da preferência do eleitorado, ante 13% de Garcia e Freitas. Garcia terá pela frente o desafio de reverter as pesquisas eleitorais, já que o último candidato tucano que não esteve à frente nas pesquisas a pouco mais de 70 dias das eleições foi Mário Covas em 1998, ainda segundo o instituto. No dia 13 de julho, uma pesquisa mostrava Covas com 18% da intenção de voto, atrás de Francisco Rossi (PDT), com 27%, e Paulo Maluf (PPB), com 25%. Na ocasião, Covas foi o segundo mais votado no primeiro turno e venceu Maluf na segunda etapa. Para retornar ao poder, Garcia deverá se inspirar na corrida de Covas.
Em relação ao Congresso Nacional, os tucanos enfrentam uma verdadeira queda livre quando o assunto é representatividade nas duas Casa. Na Câmara dos Deputados, o PSDB quase alcançou a liderança na bancada partidária em 1999 com 99 parlamentares eleitos – à época, o PFL conquistou 105 cadeiras. Nas eleições seguintes, o partido registrou seguidas quedas no número de representantes. Entre 1999 e 2014, a sigla figurou entre as quatro maiores bancadas. Em 2018, caiu para a nona colocação. Em comparação, nas últimas quatro eleições, o PT, com quem a sigla sempre rivalizou, elegeu as maiores bancadas em três pleitos. Na última eleição, os tucanos elegeram 29 parlamentares, número similar aos do Republicanos (3o), do DEM (29) e do PDT (28).
Fenômeno semelhante ocorre no Senado da República – entre 1998 e 2018, o PSDB foi de 23 senadores para apenas seis. Nesta eleição, com as saídas de José Serra e Tasso Jereissati, quadros históricos da legenda, o PSDB corre o risco de ficar sem representante na Casa Alta do Congresso. O alento aos tucanos vem do Amazonas, onde Arthur Virgílio Neto lidera a corrida pela cadeira do Estado com 22% das intenções de voto, na frente do senador Omar Aziz (PSD) e do nome apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, Coronel Menezes (PL), empatados com 16%. Em São Paulo, o ex-presidente da sigla José Aníbal, suplente de Serra, apresentou-se como pré-candidato, mas sua postulação ainda não está definida porque esbarra na aliança do partido com o Podemos, que pretende indicar o deputado estadual Heni Ozi Cukier para a chapa de Rodrigo Garcia. Na quinta-feira, 21, em entrevista ao Headline News, da Jovem Pan, o presidente do Diretório Municipal de São Paulo do PSDB, Fernando Alfredo, também anunciou sua pré-candidatura ao Senado. As pesquisas, porém, não são animadoras para os tucanos, já que Alfredo não foi testado e Aníbal acumula apenas 3% das intenções de voto.
Para a professora de Ciência Política na Fundação Escola de Sociologia e Política (FESPSP) e doutora em Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Tamara Ilinsky Crantschaninov, há dois episódios que ajudam a explicar a derrocada tucana. As eleições de 2014 entre Aécio Neves e Dilma Rousseff e o surgimento de João Doria no cenário político tucano – estes acontecimentos ocorreram justamente no período em que o PSDB apresentou seus piores resultados eleitorais. A especialista avalia que houve uma ruptura na maneira como a sigla passou a se apresentar. Mesmo com a rivalidade entre tucanos e petistas nos âmbitos federal e estadual, Aécio teve um papel diferente ao ser derrotado e questionar o resultado das eleições. “Ele fez com que o partido se colocasse em um espaço fora da institucionalidade”, explica em entrevista à Jovem Pan.
Ao mesmo tempo, a chegada de Doria também segue com o tensionamento externo, com o posicionamento anti-PT, e interno, através de brigas dentro da sigla – em 2018, Doria traiu Geraldo Alckmin, seu padrinho político, e apoiou a candidatura de Bolsonaro, quando surfou a onda do voto “BolsoDoria”. Tempos depois, Alckmin deixou a legenda. Como pontua Tamara, o ex-prefeito e ex-governador de São Paulo também se apresentou como um não político, algo diferente do receituário tucano, que se orgulha de políticos históricos como Mario Covas, Fernando Henrique Cardoso, José Serra, José Aníbal, Alckmin, entre outros. De maneira contraditória, mesmo posicionando-se como um outsider e de alguém que não vivia da política, Doria buscou “escalar” seus cargos com o objetivo de assumir o Palácio do Planalto. “Lembro que as pessoas se identificavam muito com o Alckmin, até com o Covas. Existia uma identificação com o que o PSDB pregava como um partido da social democracia e esses dois movimentos faz com que mude o perfil de quem vota no PSDB”, argumenta.
Segundo a especialista, a falta de identificação dos eleitores com o partido fez com que a legenda se tornasse apenas uma sigla de alternativa à esquerda. A cientista social pontua que houve uma mudança nos últimos anos na procura do eleitorado aos seus representantes em decorrência do acirramento político. “Hoje, quem está no polo contrário ao que seria o PT, ou o representante de esquerda, é um político muito mais conservador e muito mais à direita do que sempre foi o PSDB. Os tucanos tornaram-se muito mais um partido de centro e essa polarização faz com que o PSDB vire parte dessa massa que transita entre esses dois lados”, finalizou. Procurado pela Jovem Pan para comentar o atual momento do partido, o presidente nacional da sigla, Bruno Araújo, não se manifestou até a publicação desta reportagem.
Fonte: Jovem Pan